Crônica: A cadeia liberta

Crônica: A cadeia liberta
Texto assinado por Miguel Tadeu Guimarães de Campos
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Quando um delegado chega para trabalhar numa cidade logo de início já pergunta quais os problemas da cidade.

E eu não fiz diferente (antes de ser promotor, fui delegado). Quando cheguei na pequena Floreal, logo fui informado sobre a situação e, consequentemente, que havia um rapaz famoso por sua valentia na cidade.

Com o passar do tempo, realmente conheci de perto sua fama. Brigava com tudo e com todos, batia na mulher, nos amigos e inimigos. Valente, mesmo. Mas tinha uma característica: era só quando bebia. Quando estava são era uma moça, como costumamos dizer.

Como bebia quase todo dia, dava muito trabalho, tanto que vários inquéritos foram abertos em seu desfavor.

Me recordo que na primeira vez que ele apareceu na delegacia, logo me avisaram que ele era o tal valentão.

Então, eu o chamei na minha sala e lhe disse: ___eu fiquei sabendo que você é o valente da cidade, pois agora quero que saiba que está cidade tem dois valentes, você e eu. Só que eu sou valente do lado da lei e você, contra a lei.

Isso eu tava morrendo de medo. O cara dava dois de mim. Mas fiquei firme, tava atrás da mesa e ele não viu a minha perna tremendo.

Vida que segue, ele aprontou tantas que um dia a sua prisão foi decretada pelo juiz, por quinze dias.

Ele jamais esperava por isso. Enfim, foi preso e ficou por longos quinze dias trancado e a cidade em paz.

Quando saiu a sua vida mudou. A cadeia realmente lhe serviu de lição.

E a primeira coisa que fez quando chegou em casa foi abrir as gaiolas e soltar os passarinhos que criava.

Enfim, a cadeia liberta.

  • Miguel Tadeu Guimarães de Campos, 56 anos, promotor de Justiça em Campinas-SP

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